sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Os EUA, o Oriente Médio e o lobby sionista

Ações e recursos de organizações pró-israelenses determinam, em grande medida, a política estadunidense em relação ao Estado judaico e seus vizinhos

 Ações e recursos de organizações pró-israelenses determinam, em grande medida, a política estadunidense em relação ao Estado judaico e seus vizinhos

Igor Ojeda,
da Redação


Mudança. A palavra-chave na campanha eleitoral do novo presidente dos Estados Unidos Barack Hussein Obama parece que não será levada em conta no que diz respeito a um tema fundamental: a política externa estadunidense para o Oriente Médio.

Pelo menos não a julgar por sua primeira declaração a respeito dos ataques realizados por Israel à Faixa de Gaza, que deixou 1400 mortos, em sua maioria, civis, incluindo inúmeras crianças: “Israel tem o direito de se defender”, disse o mandatário, referindo-se aos foguetes lançados pelo grupo islâmico Hamas na fronteira entre a Palestina e o Estado judeu.

A afirmação de Obama, entretanto, não foi novidade para muitas pessoas. Afinal, poucos acreditavam que a força do “novo” que o ex-senador vem carregando consigo seria suficiente para suplantar a estreita aliança existente há décadas entre EUA e Israel.

Estreita para alguns, estranha para outros. Estes últimos consideram que há tempos as políticas estadunidenses no Oriente Médio não seguem seus próprios interesses, e sim os do Estado judaico. A explicação? O enorme poder de influência que o chamado “lobby sionista” exerce nos EUA.

“Mesmo a partir de um ponto de vista imperialista, os Estados Unidos não têm um interesse particular em apoiar o genocídio israelense em Gaza. Isso é prejudicial para os EUA no Oriente Médio, pois o país está desesperadamente tentando criar uma aparência de 'estabilidade' para lidar com a destruição no Iraque e o fervor anti-estadunidense na região”, analisa Ramzy Baroud, jornalista palestino-estadunidense.

Intimidação

Um episódio ocorrido no início deste ano ilustra o contra-senso da política dos EUA para o Oriente Médio. No dia 8 de janeiro, o Conselho de Segurança (CS) da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou uma resolução que exigia o imediato cessar-fogo na Faixa de Gaza e a retirada das forças israelenses do território palestino, que estava sendo alvo de ataques.

Quatorze dos 15 países-membros do CS aprovaram a resolução; somente os EUA se abstiveram, mesmo tendo sido a própria secretária de Estado estadunidense, Condoleezza Rice, a preparar o documento. O esclarecimento para fato tão inusitado foi dado por ninguém menos que o primeiro-ministro israelense Ehud Olmert, em um discurso na cidade de Ashkelon:

“Na noite entre quinta e sexta [8 e 9], quando Rice queria liderar a votação no Conselho de Segurança no sentido de um cessar-fogo, não queríamos que ela votasse a favor. Fiz uma ligação e disse: 'ponha o presidente Bush na linha'. Falaram que ele estava num discurso na Filadélfia. Eu disse que não me importava. 'Preciso falar com ele agora'. Ele saiu do palanque e me atendeu. Eu falei a ele que os EUA não poderiam votar a favor de uma resolução como aquela. Ele, imediatamente, ligou para a secretária de Estado e disse a ela para não votar a favor”, contou Olmert.

Baroud conclui o raciocínio: “Imagine, o Olmert se gabando de como ele, num telefonema, conseguiu mudar completamente toda a agenda da política externa dos EUA. Isso nos indica que essa não é uma relação de simbiose”. Para ele, o relacionamento entre o governo estadunidense e o lobby pró-Israel é, ao contrário, “de interesses claros, transações de negócios e, às vezes, manipulação e intimidação”.

Lobby

A dimensão que tal lobby alcança foi detalhada no artigo – depois transformado em livro – “O Lobby de Israel e a Política Externa dos EUA”, publicado na London Review of Books, em março de 2006. Nele, os cientistas políticos John Mearsheimer e Stephen Walt resumem a questão: “outros grupos de interesse específicos conseguiram influenciar a política externa, mas nenhum lobby conseguiu desviá-la para tão longe do que o interesse nacional indicaria, e, ao mesmo tempo, convencer os estadunidenses de que os interesses de seu país e os do outro – no caso, Israel – são essencialmente idênticos”.

Segundo Baroud, historicamente, os EUA apoiavam uma agenda “equilibrada” para o Oriente Médio, para garantir na região uma relativa estabilidade que atendesse seus interesses. O jornalista cita o exemplo da invasão francesa, britânica e israelense contra o Egito em 1956, quando o então presidente estadunidense, Dwight Eisenhower, exigiu a imediata retirada de Israel da Península do Sinai e da Faixa de Gaza.

“Desde então, os interesses dos EUA na região permaneceram intactos. Mas o que mudou para que o governo dos EUA apareça como uma ramificação do Knesset [o parlamento de Israel]? O que mudou foi a força do lobby israelense e o nível de influência dos 'amigos' de Israel no Congresso, no Executivo e na grande mídia.”

Assistência

Os resultados de tamanha articulação foram aparecendo e se consolidando ao longo dos anos. De acordo com o artigo de Mearsheimer e Walt, desde 1976, o Estado judeu é o maior receptor anual de assistência direta, econômica e militar vinda dos EUA, o que o faz o maior beneficiário desde a Segunda Guerra Mundial, com um total de 140 bilhões (em dólares de 2004).

No plano militar, os estadunidenses já enviaram a Israel quase 3 bilhões de dólares para o desenvolvimento de sistemas de armamento, além de equipamentos de guerra como helicópteros Blackhawk e jatos F-16.

Além disso, a ajuda nessa área também vem se dando também em ocasiões de conflito, como a Guerra de Yom Kipur (1973), quando 2,2 bilhões de dólares em assistência militar de emergência foram concedidos.

Outro exemplo aconteceu em maio de 2002. Após Israel ter invadido novas áreas na Cisjordânia, a Câmara de Representantes dos EUA aprovou uma concessão de 200 milhões de dólares ao Estado judeu, para ser usado no combate ao terrorismo.

Diplomacia

Anualmente, o Estado judaico recebe 3 bilhões de dólares em assistência direta (20% do orçamento estadunidense para a ajuda externa). Desse total, o país está autorizado a gastar 25% na própria indústria de defesa, privilégio exclusivo entre os receptores de ajuda estadunidense.

A colaboração econômica e militar vem acompanhada, ainda, do apoio no campo diplomático. Ainda de acordo com Mearsheimer e Walt, desde 1982, os EUA vetaram 32 resoluções do Conselho de Segurança da ONU que eram críticas a Israel, número maior que o total de vetos de todos os outros membros do organismo que possuem tal poder. Além disso, os estadunidenses obstruem todos os esforços dos países árabes para que a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) inspecione o arsenal israelense. (Leia mais na edição 309 do Brasil de Fato)


*BRASIL DE FATO

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